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Build Up Eletronic Fashion Show



O senso de humor, o rosto angelical e a voz delicada não são as únicas semelhanças entre Nina e Rita. Nina, você sabe, é talentosa, criativa e divertida estilista e criou discos e shows para cada coleção que lançou. Rita não só era a estilista informal dos Mutantes como fez uma série de shows-desfiles pra Rhodia, chegou a ser convidada a lançar uma linha de roupas com seu nome e, pro Build Up, fez um espetáculo misturando música, moda, cultura pop, metalinguagem.

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Amigo de Lívio Rangan, o chefão da Rhodia, Midani costumava se reunir com ele para sugerir nomes de artistas, sempre que uma nova superprodução da empresa era planejada. Num desses encontros, no início de 1970, ao sentir um especial interesse de Rangan pelos dotes artísticos da garota, Midani percebeu que chegara o momento de investir na carreira individual de Rita. O big boss da Philips já sabia que as coisas não andavam bem entre os Mutantes e, apesar de ser fã do trio, calculou que a separação poderia ser boa para todos os envolvidos.

O shw Nhô Look era mais uma prova de que Rita levava mesmo jeito para o palco. Elogiada por seu desempenho, ela teve nesse espetáculo a chance de mostrar seu talento extra-musical. Além de cantar e dançar, interpretava o papel de uma garota caipira, Ritinha Malazarte, acompanhada por uma bandinha interiorana com 14 músicos. A coleção exibida por Rita e as manequins do elenco (entre elas Mila Moreira, que depois veio a se tornar atriz) adaptavam para o contexto brasileiro a moda paysan, inspirada no vestuário das camponesas européias.

Além do próximo show-desfile da Rhodia, na Fenit, do qual seria novamente a protagonista, Rita também foi convidada a criar roupas para uma grife jovem, que levaria seu nome. Se os Mutantes não se cuidassem rápido, corriam o risco de perder sua vocalista.

Apesar da resistência de Rita, maior ainda depois que ela voltou às boas com os Mutantes, os planos de André Midani e da Philips para transformá-la em uma cantora de sucesso prosseguiram conforme o traçado. Em julho, Rita retornou ao velho Estúdio Scatena para gravar seu disco, quase a toque de caixa. O álbum deveria estar prensado até meados de agosto, para ser lançado durante a nova produção da Rhodia, na qual Midani também deu vários palpites, de olho no marketing que o espetáculo renderia para a carreira solo de sua nova estrela.

"Encontramos a estrela da década!
Rita Lee"

O outdoor que surgia no encerramento do novo show da Rhodia, com Rita no papel principal, fundiu a cuca de muita gente. Depois da anunciada separação dos Mutantes, da boa atuação de Rita no show-desfile Nhô-Look e, mais ainda, após a notícia de que ela acabara de gravar seu primeiro disco individual, era difícil para quem visse esse espetáculo acreditar que ela ainda ligava seu futuro musical ao dos irmãos Baptista.

Na véspera da estréia do show, no Pavilhão do Ibirapuera, Rita jurava aos repórteres que nem passara por sua cabeça deixar de ser a vocalista dos Mutantes. No entanto, o espetáculo que estreou dia 8 de agosto de 1970, dentro da FENIT (Feira Nacional da Indústria Têxtil), sugeria algo bem diferente. Para começar, o próprio enredo do Build Up Eletronic Fashion Show girava em torno de uma garota (Rita Lee) que sonhava se tornar uma grande estrela. Outro detalhe significativo: Build Up (expressão que significa construir uma imagem; criar em torno de uma pessoa, ou de um produto, uma maneira de facilitar seu consumo) era também o título do LP de Rita, que a Philips prometera distribuir às lojas alguns dias mais tarde.

Produzido por Roberto Palmari, com direção musical de Rogério Duprat e Diogo Pacheco, o show mostrava, com boas doses de meta-linguagem, os bastidores do mundo da comunicação de massa e da propaganda. O cenário reproduzia as instalações de uma agência de publicidade, cujos clientes era, na verdade, os 14 patrocinadores do esptáculo, caso dos postos de gasolina Esso, do cigarro Hollywood, do rum Bacardi, do uíque Old Eight, da bicicleta Caloi, ou da revendedora de automóveis Bino-Ford, entre outros.

O elenco também era enorme. Além de 16 manequins da Rhodia e do balé de Ismael Guizer, participaram o ator Paulo José (como o diretor artístico da imaginária agência), os cantores Jorge Ben, Juca Chaves, Tim Maia, Marisa (vocalista do Bando) e os conjuntos Trio Mocotó, Lanny's Quartet, Coral Crioulo, Os Ephemeros e Os Diagonais. No palco, havia também um sofisticadíssimo sistema audiovisual, controlado por um computador eletrônico, que utilizava seis telas - em quatro delas eram exibidas centenas de slides; em duas outras, um documentário colorido em 16mm.

Rita saiu-se muito bem. Mais uma vez, representou, cantou, dançou e atuou como garota-propaganda, graças a um papel que serviu como uma luva à sua irreverente verve humorística. Ao interpretar a garota ingênua e desajeitada que sonhava se tornar manequim, chegava a escorregar e cair sentada durante um desfile, arrancando muitas risadas do público.


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Da Divina Comédia dos Mutantes, do Carlos Calado.

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