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Entrevista: Paulo Cesar de Araújo



Duas semanas atrás Paulo Cesar de Araújo, autor do censurado Roberto Carlos em Detalhes, comemorou.

Como você certamente se lembra, há pouco mais de um ano Roberto entrou com dois processos criminais e um civil contra Paulo Cesar e a Editora Planeta porque não gostou de ver lançado o livro, que saiu no dia primeiro de dezembro de 2006. Em uma "audiência conciliatória" entre o cantor e seus advogados e Paulo Cesar e os advogados da Editora Planeta, o livro saiu proibido por um acordo em comum - ou foi o que pensamos na época. Pouco depois, Paulo Cesar contou: a audiência havia sido um show de horror, com o juiz fazendo ameaças a ele e tietagens pra cima de Roberto.

E agora, um ano depois, Paulo Cesar teve sua primeira pequena vitória nessa briga de Davi contra Golias: na vara cível, a juíza Márcia Cristina Cardoso de Barros tirou a razão de Roberto Carlos. Eu aproveitei a história toda para conversar com Paulo Cesar, descobrir mais detalhes e saber em que pé anda tudo.

O que significa, na prática, essa nova sentença da juíza Márcia Cristina Cardoso de Barros? Há chances do livro voltar às lojas? A Planeta está disposta a comprar a briga?

O livro continua proibido, mas a juíza deu mais munição para eu continuar na luta porque afirmou que Roberto Carlos não tem razão nesse processo. Invasão de privacidade, uso indevido de imagem, exploração comercial de seu nome – de nada disso pode ser acusado o livro "Roberto Carlos em Detalhes". Ao contrário de juizes anteriores, que se valeram de regras gerais para julgar um caso especifico, a magistrada analisou esta biografia na sua especificidade. Ela argumentou, por exemplo, que a "obsessão compulsiva de tudo controlar sobre si mesmo" não pode se sobrepor ao "direito democrático constitucional de informação", especialmente "se a pessoa é pública e a informação verdadeira". Enfim, ficou claro agora que o livro está amparado pela legislação do país. Isto, inclusive, já tinha sido enfatizado por juristas e advogados como, por exemplo, o ex-ministro Saulo Ramos. Mas desta vez é a palavra de uma juíza titular que trabalhou no caso, analisou os autos e proferiu a sentença. Por tudo isso, vou continuar lutando para trazer o livro de volta. Já a Editora Planeta não quer saber de briga com Roberto Carlos. Portanto, estou agora sozinho nesta luta.

Como você se lembra hoje da audiência de reconciliação em abril de 2007 em que o juiz e compositor Tércio Pires entregou um CD a Roberto Carlos, na qual o "contexto era desfavorável" a vocês e da qual o livro saiu proibido?

Aquele foi talvez o pior momento da minha vida. Vi um trabalho de quinze anos ser destruído numa reunião de cinco horas. O mais grave não foi o juiz dar o CD a Roberto e depois tirar fotos com ele. O pior foram as ameaças. Por duas vezes o juiz disse que poderia mandar fechar a Editora Planeta. Isto assustou os diretores da empresa. O juiz e os promotores também enfatizaram os riscos de carregarmos um processo criminal nas costas. Enfim, o que seria uma "audiência de conciliação" acabou se tornando uma "audiência de condenação".

A propósito, você acha que Roberto ouviu o CD do juiz cantor?

Acho que Roberto Carlos ouviu sim e depois deve ter manifestado sua opinião ao juiz, pois ele fez este pedido ao cantor. "Roberto, por favor, ouça este disco e dê a sua opinião sincera. Este é o meu primeiro CD, já estou gravando agora um segundo, e gostaria muito de ouvir a sua opinião".

Você sente que o comportamento do juiz foi pontual ou é representativo da justiça brasileira?

O comportamento deste juiz foi apenas mais um exemplo do que freqüentemente acontece no Brasil. A lei é para todos, mas a interpretação que a Justiça faz da lei é, na maioria das vezes, favorável aos mais poderosos e influentes.

Olhando em retrospecto hoje todas as reportagens, opiniões, colunas, editoriais e notas sobre a censura do livro, considera que a imprensa tratou bem toda a história?

De maneira geral o tratamento foi bom, pois houve uma ênfase no direito à liberdade de expressão. A lamentar o fato de que a maioria daqueles que escreveram sobre o caso não leu o livro e enfatizou apenas aquilo que seriam as reclamações de Roberto Carlos: o caso Maysa, a morte de Maria Rita, o acidente na infância. Isto deu ao público a falsa impressão de que o livro fala somente da vida pessoal do artista. Entretanto, como você observou bem na crítica que escreveu na Folha, "Roberto Carlos em detalhes" é muito mais do que isso. O livro traz milhares de informações sobre Roberto Carlos e a música brasileira, redimensiona a obra do cantor, situando-o em momentos cruciais, tais como na era do rádio, na eclosão da bossa nova e depois no tropicalismo.

Depois de todo o auê - positivo e negativo - da novela Roberto Carlos em Detalhes, futuras biografias correm risco, Roberto abriu precedentes perigosos?

É um precedente perigosíssimo, porque se valer para os outros o que está valendo para Roberto Carlos ninguém mais poderá escrever a história do Brasil. Fernandinho Beira-Mar, por exemplo, é um personagem da nossa história e também poderá impedir que alguém escreva sobre ele usando os mesmos argumentos de Roberto Carlos: "Minha história é um patrimônio meu, eu é que tenho que escrever a minha biografia, não autorizei o uso de imagem, estão invadindo a minha privacidade...". Por outro lado, este caso foi tão absurdo que chamou a atenção para as brechas da lei que dão respaldo a isso. O deputado Antônio Palocci apresentou agora no Congresso Nacional um projeto de lei favorável a publicação de biografias não-autorizadas no Brasil. E estou otimista porque este é um projeto apoiado pelo poder econômico, as editoras. Não acredito na formação de uma bancada antibiografias. Ou seja, de precedente perigosíssimo, esta minha polêmica com Roberto Carlos poderá resultar numa mudança da lei que favoreça a liberdade de expressão e o direito à informação.

E, afinal, até agora você chegou a ouvir algo diretamente do Roberto? Sabe se ele leu o livro ou se continua sabendo de tudo apenas pelos resumos adulterados do advogado Marco Antonio Bezerra Campos?

Se Roberto Carlos tivesse lido meu livro jamais teria me processado. Mas como analiso naquele capítulo "Roberto Carlos e a política", ele não tem mesmo o hábito de ler; prefere ver televisão, especialmente novelas e programas tipo Big Brother. O próprio advogado dele, Marco Antônio Campos, confirmou numa entrevista, dias depois do acordo, que o cantor não leu o livro. "Nas primeiras reuniões, fizemos um resumo para ele. Depois ele leu alguns trechos, só".

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5 Responses to “Entrevista: Paulo Cesar de Araújo”

  1. # Anonymous Anônimo

    arte de daviran
    retrospectiva-40 anos de arte  

  2. # Anonymous Anônimo

    Eu acho muito babaca criticar os outros sem jamais os ter visto. Acho imbecil ter uma opinião sobre uma pessoa com base apenas no que a "aura" (?) dela inspira. Mas vou lhe falar uma coisa: Roberto Carlos é um imbecil.

    Guilherme Montana
    (http://guilhermemontana.blogspot.com/)  

  3. # Blogger Ronaldo Evangelista

    Realmente dá pra dizer com pouca margem de erro que Roberto vacilou feiaço nessa história.  

  4. # Anonymous Anônimo

    necessario verificar:)  

  5. # Blogger Alexandre Lancaster

    Sinceramente: minha opinião pessoal sobre Roberto Carlos, após essa história, após as ameaças ao Rogério Skylab e após o que aconteceu por esses dias em Copacabana, é que ele como pessoa é alguém que me inspira o mais profundo desprezo. Eu avisei a minha mãe que me recuso a dar um centavo para essa criatura e me arrependo de um ou outro eventual disco desse sujeito que eu tenha dado para ela um dia.  

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