Já que o assunto é Monk, crítica que escrevi na Folha, 2005, quatro-de-quatro estrelas, sobre o disco descoberto há poucos anos, mas gravado magistralmente em 1957, Carnegie Hall.
Primeiro, o silêncio. As palmas entram tímidas logo depois e, aos 11 segundos, o piano. A introdução é tocada somente pelo pianista, com a delicadeza e a complexidade que lhe são habituais. Exatamente no meio de uma frase do piano surge o saxofone, acompanhando o raciocínio melódico e expandindo as idéias musicais iniciadas dois minutos e seis segundos atrás. Os dois continuam se entremeando e se completando, solitários, até o primeiro toque da vassourinha na bateria, aos quatro minutos e meio.
Até o fim dos quase oito minutos de duração de "Monk's Mood", o tempo parece parar para que a música possa existir. Não é apenas um quarteto tocando piano, saxofone, baixo e bateria, são quatro pessoas criando mágica diante de nossos ouvidos. É o fluxo de consciência em tempo real de dois dos maiores pilares do que acostumamos a chamar jazz nos últimos 50 anos. Por quase uma hora, acompanhamos os improvisos saídos do piano de Thelonious Monk, do saxofone de John Coltrane, do baixo de Ahmed Abdul-Malik e da bateria de Shadow Wilson - tudo o que aconteceu na noite de 29 de novembro de 1957.
As palmas entram, sempre, no penúltimo segundo de cada música, quando o público percebe instintivamente as composições matematicamente marotas chegando ao fim.
A segunda música do set, "Evidence", novamente começa com Monk solitário ao piano, até Coltrane chegar, acompanhando-lhe exatamente na mesma linha melódica. O impressionante Shadow Wilson (que morreria dois anos depois, deixando seu nome injustamente esquecido) vem logo atrás, dessa vez marcando presença com a bateria levada no chimbau. Por baixo, Ahmed Abdul-Malik sustenta e acompanha ritmo, andamento, harmonias, melodias.
Na terceira música, voltamos à lenta complexidade das harmonias e melodias desconstruídas de Monk na bela "Crepuscule with Nellie", algo como um standard negativado, aquela especialidade Monk: a familiaridade, as melodias perfeitas, tocadas com aquele toque de subversão. Coltrane, Wilson, Abdul-Malik entram pouco depois dos dois minutos, no mesmo toque.
Em "Nutty", faixa seguinte, todos funcionam juntos, empolgante máquina rítmica. Coltrane sola com vontade e deixa fluir a inspiração, vinda tanto do bebop como do cool, já mostrando o engrandecimento completo que estava por vir.
"Epistrophy", dos maiores clássicos de Monk, com seus diferentes andamentos de bateria, é o ponto mais alto de um clássico tão grande, onde todos se encontram em seu momento mais inspirado.
E isso é só o primeiro set, de ainda outro com composições diferentes, todas de Monk - exceto pelo único standard tocado pelo quarteto na noite, "Sweet and Lovely" (também gravado anos depois pelo pianista em disco solo).
Após quase 50 anos na estante, a música passada de sons para fitas para CD para LP continua não só tão moderna e atemporal quanto no dia em que foi gravada, mas se revela o registro definitivo do encontro de Thelonious Monk sendo tão Thelonious Monk quanto poderia e John Coltrane registrando os primeiros ápices de genialidade.
Injusto é avaliar o disco com as mesmas quatro estrelas que todos os outros.
Primeiro, o silêncio. As palmas entram tímidas logo depois e, aos 11 segundos, o piano. A introdução é tocada somente pelo pianista, com a delicadeza e a complexidade que lhe são habituais. Exatamente no meio de uma frase do piano surge o saxofone, acompanhando o raciocínio melódico e expandindo as idéias musicais iniciadas dois minutos e seis segundos atrás. Os dois continuam se entremeando e se completando, solitários, até o primeiro toque da vassourinha na bateria, aos quatro minutos e meio.
Até o fim dos quase oito minutos de duração de "Monk's Mood", o tempo parece parar para que a música possa existir. Não é apenas um quarteto tocando piano, saxofone, baixo e bateria, são quatro pessoas criando mágica diante de nossos ouvidos. É o fluxo de consciência em tempo real de dois dos maiores pilares do que acostumamos a chamar jazz nos últimos 50 anos. Por quase uma hora, acompanhamos os improvisos saídos do piano de Thelonious Monk, do saxofone de John Coltrane, do baixo de Ahmed Abdul-Malik e da bateria de Shadow Wilson - tudo o que aconteceu na noite de 29 de novembro de 1957.
As palmas entram, sempre, no penúltimo segundo de cada música, quando o público percebe instintivamente as composições matematicamente marotas chegando ao fim.
A segunda música do set, "Evidence", novamente começa com Monk solitário ao piano, até Coltrane chegar, acompanhando-lhe exatamente na mesma linha melódica. O impressionante Shadow Wilson (que morreria dois anos depois, deixando seu nome injustamente esquecido) vem logo atrás, dessa vez marcando presença com a bateria levada no chimbau. Por baixo, Ahmed Abdul-Malik sustenta e acompanha ritmo, andamento, harmonias, melodias.
Na terceira música, voltamos à lenta complexidade das harmonias e melodias desconstruídas de Monk na bela "Crepuscule with Nellie", algo como um standard negativado, aquela especialidade Monk: a familiaridade, as melodias perfeitas, tocadas com aquele toque de subversão. Coltrane, Wilson, Abdul-Malik entram pouco depois dos dois minutos, no mesmo toque.
Em "Nutty", faixa seguinte, todos funcionam juntos, empolgante máquina rítmica. Coltrane sola com vontade e deixa fluir a inspiração, vinda tanto do bebop como do cool, já mostrando o engrandecimento completo que estava por vir.
"Epistrophy", dos maiores clássicos de Monk, com seus diferentes andamentos de bateria, é o ponto mais alto de um clássico tão grande, onde todos se encontram em seu momento mais inspirado.
E isso é só o primeiro set, de ainda outro com composições diferentes, todas de Monk - exceto pelo único standard tocado pelo quarteto na noite, "Sweet and Lovely" (também gravado anos depois pelo pianista em disco solo).
Após quase 50 anos na estante, a música passada de sons para fitas para CD para LP continua não só tão moderna e atemporal quanto no dia em que foi gravada, mas se revela o registro definitivo do encontro de Thelonious Monk sendo tão Thelonious Monk quanto poderia e John Coltrane registrando os primeiros ápices de genialidade.
Injusto é avaliar o disco com as mesmas quatro estrelas que todos os outros.
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