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Um milhão de discos

Na verdade, mais de um milhão, já diz o título da matéria que escrevi para a revista sãopaulo, da Folha, publicada domingo passado. O personagem é Jorge Dias, engenheiro de implosões, o cenário são galpões gigantes na Mooca cheios de bricabraques e vinis e a história é maravilhosa. A foto inacreditável é do Eugênio Vieira e o texto você lê por aqui ou logo abaixo.



Passando pelas ruas da Mooca , do Oratório ou dos Trilhos, é impossível não notar: os móveis, quadros, objetos e antiguidades ocupam todos os espaços, cobrindo portas e formando corredores. Os discos de vinil lotam estantes do chão ao teto com enorme pé-direito, e um casarão ostenta faixas de "Família vende tudo todos os dias".

São os quatro endereços da loja Presentes do Passado, também já conhecida como Sebo Jovem Guarda, cenário e memória viva da Mooca.

Por dentro, é ainda mais impressionante a variedade de coisas, em quantidade difícil de ser totalmente compreendida: máscaras africanas, órgãos analógicos, filmadoras, esculturas, revistas, lustres, pinturas, garrafas, muitos móveis, muitos quadros, muitos livros e muitos, muitos discos, além do simpático cão Delegado Billy e de sua namorada, Belinha, e do responsável por tudo, Manoel Jorge Diniz Dias, 55.

Até dois anos atrás, tudo não passava de hobby. Jorge -ou Manezinho da Implosão, como era conhecido- foi o engenheiro técnico responsável por "praticamente todas as implosões que você viu na televisão".

Entre os mais de 80 prédios e 200 pontes que trouxe abaixo, cinco pavilhões do Carandiru, o prédio da Cesp na avenida Paulista e a mais difícil e famosa implosão do Brasil: a do edifício Palace 2, em 1998. Em sua carreira de destruidor, dava até autógrafos.

Parafusos
Em 2000, com o mesmo impulso que o fazia visitar fábricas na infância para conseguir parafusos e revender em oficinas mecânicas, Jorge comprou, em um leilão, todo um lote de produtos da Avon, de calcinhas a CDs.

Montou ponto perto de casa, na rua do Oratório, e seguiram-se trocas e compras de livros. Em pouco tempo vieram telas e objetos e, finalmente, vinis. Hoje, Jorge é dono de um dos maiores acervos de discos do país, com mais de 1 milhão de itens.

"Quando garoto, colecionava chaveiros, caixas de fósforo, embalagens de cigarro", lembra. "Coleção tem um poder de sedução muito grande e só vai ganhando valor com o tempo."

Foi a paixão pelo colecionismo somada à experiência de reciclagem. "A demolição está sempre associada ao reaproveitamento. Você aproveita cada material", diz Jorge.

Caminhões de bolachas
Em 2003, Jorge encontrou um lojista interessado em vender um grande lote de vinis para comprar um imóvel. Com ele, era o inverso. "A gente se cruzou e comprei 200 mil discos de uma vez só", conta. "Tive que levar tudo em dinheiro e, toda noite, durante uma semana, carreguei caminhões e caminhões de discos de vinil."

Hoje, ele vem diminuindo o trabalho com as implosões e aumentando o tempo que dedica aos discos e às antiguidades, que já geram lucro.

Além de pagar seis aluguéis mensais para manter tudo estocado (um dos quatro galpões é composto por três imóveis conjugados), contratou uma equipe de nove pessoas, que passa os dias colocando todo tipo de coisa em sites de leilão na internet, como Mercado Livre e eBay.

Chegou a mil itens cadastrados por dia e já tem catalogados 290 mil. A meta é atingir meio milhão. Hoje, ele vende, em média, 40 objetos por dia.

Os números são tão altos que Jorge vislumbra a chance de criar um centro cultural. "Qualquer museu que a gente monte com esse acervo será maior que o de qualquer entidade", diz. "Penso em criar um polo cultural ou armar uma parceria, por exemplo, com o Instituto Moreira Salles. Mas ainda estamos avaliando tudo."

Curiosamente, Jorge não tem uma relação especial com a música. "Gosto mesmo é de olhar as capas", confessa, com sorriso de criança que completou a coleção.

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